
Diz uma certa linha de pensamento que, o amor, quando verdadeiro, sobrevive a distância. Que o amor sobrevive a tudo e a todos. Richard Bach, mesmo, tem um livro intitulado “Longe é um Lugar que não existe”, onde fala da constante presença do ente amado, presença auréola de um sentimento que sobrepuja o espaço. Já fui adepto deste pensamento, poético, romântico e, porque não dizer, esperançoso. E não digo isto para afirmar que não lhe tenho mais simpatias, mas digamos que mantemos, atualmente, eu e ele, um relacionamento de amistosa desconfiança. Nos gostamos, é verdade, mas também não nos aproximamos muito, como se nosso encontro nos machuca-se.
A questão surgiu quando conversava, esta semana, com uma amiga que mantêm um namoro de três anos de distância. Claro que os dois não estão três anos sem se verem, nem se encontram a três anos de distância (embora isso vala para alguns casais, que mesmo a tanto tempo viajando a velocidade da luz ainda não se encontram), mas mantêm um relacionamento onde, dos 1095 dias que o compõe, nem um sexto foi passado face a face.
Já mantive relacionamentos deste tipo, e atualmente embarco em mais uma experiência, embora a anterior tenha, por assim dizer, naufragado. Duas ideias me vêm a mente.
A primeira afirma que se o amor sobrevive a distância, certamente não significa que ela o faz bem. Falando de outra forma, digamos que, apesar da distancia o amor sobrevive. Ainda sim, esta frase não diz nada sobre a qualidade de vida do amor nestas condições. Maltrapilho, esfomeado, depressivo. a três anos minguando a existência, contudo vivo! Sub-vivo! Claro que neste contexto de guerra tal amor pode ser declarado herói, mas isso pode acontecer se ele for capaz de regressar a sua terra natal, ou se seu corpo se perder em combates estrangeiros. Resumindo. A distância, o amor até sobrevive, mas certamente não vive bem!
Para defender um pouco mais a questão acima, me valho de Vinícius: “Amor é a vontade de estar perto se longe, e mais perto se perto”. Se é a esperança do reencontro que mantém vivo um amor cujos corpos não se encontram, a distancia certamente será um de seus algozes cotidianos. Um sofrimento que arde no peito daquele que quer perto um afeto longe, que espera pelo abraço do braço que não tem, que deseja o carinho que não é capaz de se manifestar cotidianamente em toques, e envia singelas palavras para lhe substituir.
Para sobreviver, ele guarda a foto da amada no bolso, sonha com o regresso ao lar, mantêm esperanças num futuro promissor. Engraçado que isto, por si só, pode levá-lo a hipervalorizar a vida que possuía, e viver num mundo de alucinações amorosas. Sua vida depende disso! E dependerá, pois caso seu retorno não materialize os louros sonhados, o sentimento de ter enfrentado uma guerra sem sentido lhe ruirá o chão. A permanência da dúvida por todos os caminhos que segue também é seu algoz.
Mas existe uma segunda questão que me incomoda ainda mais nesta linha de pensamento, além da devoção a sobrevivência de um amor maltrapilho pela esperança do re-encontro. É de que a sobrevivência, e unicamente ela, garante sua verocimidade! Caso fracasse, provará que não é, ou foi, bom o suficiente, não tinha os méritos do bom e eterno amor. Não era mesmo pra ser.
Esta é a parte que me causa verdadeiro nojo. A presunção de que o amor verdadeiro é aquele que sobrevive, que, digamos assim, se eterniza. Esta mania ocidental de agregar valor apenas ao que se arrasta no tempo me faz entender o porque que da existência de tantos amores constantemente maquiados. Fingem que são jovens, disfarçam as rugas e as olheiras, não aceitam o cansaço da vida, do tempo, não reconhecem que perderam o brilho, não enfrentam, não necessariamente com o término, mas com o corpo aberto, a verdade do desgaste da vida. Mantêm-se porque devem mater-se! Sobrevivem apenas por sobreviver!
Agir assim é creditar ao amor uma função que não lhe pertence, e julgar como principais suas características mais desnecessárias. Amor é verdadeiro quando vale a pena, quando dá prazer, quando produz felicidade. E isto, é claro, não dá para maquiar. A gente pode tentar, se vestir melhor, fazer plásticas e disfarçar o efeito da idade, mas sempre sabe o tempo que tem.
Talvez não tenha sido claro o suficiente, talvez, ao lerem estas meras linhas, lhes fiquem algo como uma multiplicidade de sentidos, de possibilidades. Mas é assim mesmo, falamos de amor, e quando se faz isso nunca convêm explicar muito. Apenas uma última coisa cabe ser dita aqui. Penso que o amor, a distância, mantêm de uma forma peculiar o que acredito ser o principal desafio deste sentimento: manter vivo seu sentido, reinventando-se constantemente!
Podem me perguntar... Ora ora, mas começaste o texto afirmando que novamente embarcaste numa viagem dessas... lhes respondo meus amigos. No amor, nada faz sentido, e é a ausência de sentido que garante a esperança do amor!
Um comentário:
Estás se amando pouco. Se se amasse mais, largaria todas estas mentiras/utopias/quimeras e viveria a realidade. Qual é a realidade? A militâcia, o estoicismo, a inabalidade. Pra quê? Pros que estão lá em baixo verem o quanto transcedeste, sem ajuda deles.
O homem apaixonado não chega à lugar algum(concernente à mulheres). Só dá o pouco que não tem. Em troca, nada recebe.
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